terça-feira, fevereiro 06, 2007

Tentativa

A estrada à noite sempre teve uma inexplicável atracção sobre mim. O andar numa estrada escura, só, entregue aos meus pensamentos conduzidos por quatro rodas era uma espécie de terapia do desengano.
No entanto, naquela noite sabia perfeitamente onde ia, bem como os meus propósitos. Um carro ou outro cruzavam-se no meu caminho mas nada me demovia.
Ia para o porto. Tinha chegado um cargueiro e a minha esperança era que tu pudesses ter viajado escondido em um qualquer contentor e esperasses pelo momento certo para sair. Eu estaria à espera assim como há 5 anos atrás estive no mesmo porto a ver-te fugir. Dizias: "tenho de ir, tenho de saber se consigo". Eu nunca soube se tinhas conseguido, se tinhas chegado bem ou sequer chegado de todo. Nunca soube mais nada de ti.
Costumam dizer que o tempo dá sossego mas nem sempre é assim. Andava inquieta ultimamente.
Cheguei. Parei o carro perto do gradeamento, ouvia as ambulâncias ao fundo, havia um hospital relativamente perto. Desliguei as luzes e esperei. Fumei, olhei para o relógio, olhei à volta, escutei, e parei. Não se passava nada.
Os contentores ainda descansavam como peças de lego perfeitamente encaixadas.
Comecei a pensar que talvez fosse a minha imaginação. Andava ansiosa demais. Tinha decidido deixar de tomar os ansiolíticos.
Pensava que se algum dia me deixasses não conseguia sobreviver. Mas já tinha passado tanto sem ti. Mas hoje sabia que não ia para casa sozinha.
Saí do carro, agarrei-me ao gradeamento e comecei a trepar.
Escorregava e comecei a pensar que talvez não valesses a pena. Fiquei sóbria de repente. Amava-te, ou à tua lembrança, mas fazias-me chorar. Para quê o esforço? Afinal tu nem estarias lá. Serias só mais um episódio na minha imaginação.
Resolvi descer. Entrei no carro. Fumei mais um cigarro e olhei à volta.
Sorri... e conduzi para casa.
Sozinha.